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Na era da individualidade máxima, telefones e computadores substituem a boa e velha relação sexual ou  vulgarmente chamada de "queca"

 

Solidão sexual é um tema antigo, mas nem tanto. Foi preciso primeiro criar a história e a cultura para depois surgir a solidão sexual.

"Prometeu", por exemplo, acorrentado por ordem de "Zeus", no alto de uma montanha, foi um dos primeiros solitários de que se tem notícia desde que o mundo passou a ter história. Além da dor física, o pobre herói, na flor da idade e com os harmónios a fervilhar no corpo, tinha de suportar também uma solidão medonha. Dá para imaginar o jovem e belo "Prometeu", ali, pelo milésimo dia de suplício e carência sexual, a olhar já com certo interesse lúbrico para o abutre divino. Tipo “não tem tu, vais tu mesmo”.

 

Antes de Prometeu e sua horrível solidão, o que havia eram humanóides peludos aglomerados numa caverna, tremendo de medo da natureza, tentando inventar o fogo e a roda e desenhando aqueles bisontes e cervos que iriam garantir o emprego e a reforma dos futuros arqueólogos.

Ali, na pré-história, pelo que consta, não existia solidão e copulava-se  à vontade. Era só chegar, roçar e mandar ver. Talvez nem fosse preciso roçar. Machos e fêmeas não faziam questão de beleza nem de posição social por parte dos parceiros. Muito menos de inteligência. Se houve algo parecido com o paraíso, foi aquilo.


Carência, mesmo, veio depois da Queda. Ou seja, com a expulsão do paraíso. Foi quando os macacões finalmente aprenderam a falar. Viraram humanos. Alguns, como era previsível, só falavam idiotices, revelando-se uns chatos de galocha e sendo por isso marginalizados e até expulsos da tribo. Tornaram-se solitários do tipo “ninguém me ama, ninguém me quer, ninguém me chama de meu amor....”, Existe até quem afirme que a única vantagem da solidão é a pessoa se poder sentar no "trono de porcelana" com a porta da casa de banho aberta.


Acontece que a solidão, especialmente a sexual, está a deixar de ser um problema. Ao contrário, está a ser valorizada, o que é péssima notícia para os psicanalistas, que poderão ver seus consultórios se esvaziarem do dia para a noite.

Uma pesquisa recente nos Estados Unidos (claro), revelou que a família ideal é hoje composta de um solitário, um animal de estimação e um computador multimédia, ligado à Internet.


Em torno desse núcleo gravita toda uma constelação de parentes-entre-parênteses: microondas e congelados, TV a cabo e DVD, telemóvel, fax, livros (poucos), revistais (muitas), som, sauna doméstica, armas, aparelhos de ginástica, móveis inteligentes (há uma cama programada para colocar a pessoa de pé, suavemente, de manhã) e tudo isto e muito mais ao alcance de um sólido cartão de crédito.
O sexo interativo-não-virtual (leia-se a boa e velha relação sexual) vai se tornando uma curiosidade do passado. Só os hippies embalsamados, índios e parte do proletariado ainda se entusiasmam com a ideia de praticar sexo. Entre os adolescentes também se nota algum interesse sexual, mas nada que uma boa ligação à internet não resolva com facilidade.


O fato é este: o não-sexo é o que há em matéria de comportamento moderno. Basta olhar em volta. O adultério (lembram-se dele?) está desclassificado como crime no Código Penal , talvez por falta de adeptos.

A libido? Esta instalou-se de vez no aparelho auditivo, como atesta a proliferação incontrolável de sexo por telefone. E não é à toa que a cocaína, droga que reduz a zero os sinais vitais do organismo, tem vindo a conquistar despudoradamente a classe média. A pessoa perde a fome, o sono e o desejo, gastando quase toda a energia num blablablá sem fim, ao qual ninguém presta a menor atenção.


Vamos abrir os olhos e reconhecer: O sexo está em vias de extinção, como: O lince (serra da Malcata) e    a águia real (Noroeste de Portugal), e não há (Quercus) que venha socorrê-lo. Também, pudera! Dos anos 80 para cá, o sexo está associado a pragas como a Sida herpes, hepatite C e gravidez indesejada, entre outros estorvos e ameaças à vida. O discurso clínico tende a tirar o sexo dos hotéis, carros etc.. para confiná-lo num hospital. Os resultados disso não se fizeram esperar.

 

Agora o machão contemporâneo, por exemplo, gaba-se das mil mulheres maravilhosas que heroicamente não levou ao leito e de sua fabulosa colecção de preservativos (tem até um que toca um cocoricó de galo na hora H), todas elas intactas dentro do invólucro. E o tamanho do pénis também não é mais documento (como, aliás, nunca foi). Documento, mesmo, é um atestado anti-HIV negativo com data recentíssima para se pendurar na parede da alcova. Sem contar a criminalização do "flirt" ou "namoriscar", rebaptizada de “assédio sexual”, que em vez de cama dá cana, como já observou mais de um Mike Tyson da vida.

 

Sintomas de dessexualização progressiva do quotidiano proliferam por toda parte. Na Espanha solerosa, existe um Clube de Castidade, com rápidas e extensas ramificações internacionais. O casto-mor é um físico chamado Marcos Gutierrez, que, pelo visto, de físico mesmo não tem nada. O Clube de Castidade defende a abstinência ostensiva do sexo antes, durante e depois do casamento. Os noivos exibem com orgulho o lençol branco, virginal, na manhã seguinte à noite de núpcias, indicando que sobre ele não se passou nada de interessante.


A maioria dos pseudo castos, porém, continuam a evitar  a proximidade de outros corpos humanos. Quem viu o delicioso filme do americano Hal Salwen, (Denise Calls Up), sabe do que se trata. Ali, um grupo de nova-iorquinos se vale do telefone para simular um convívio que prescinde por completo da presença física. O único casal que procria é  anonimamente, através de um banco de esperma, sem que o homem e a mulher jamais se vejam cara a cara. Paira, latente, a ideia de que a humanidade pode perfeitamente  reproduzir-se sem que ninguém precise de abandonar a  própria solidão.


Enfim, o que Leonardo da Vinci disse sobre a arte também se aplica ao sexo: É coisa mental. O corpo é para produzir; a mente que se vire sozinha com suas ridículas fantasias. De todo modo, não falta muito para que a ciência nos transformar em um conjunto de próteses cambiáveis, sem desejos nem necessidades que possam se auto-satisfazer. Livres da carne e seus desejos e carências, seremos todos compulsoriamente felizes na mais completa solidão.


O tédio será a principal causa de morte desse futuro anunciado. As publicações de informática ocuparão todo o espaço das revistas de “mulheres nuas” nos quiosques o que, aliás, já é uma tendência observável.

O bom da história é que a autora deste blogue assistirá a tudo isso lá do céu (ou quiçá do inferno...), onde estará de visita como bloguista a pesquisar para fazer um post sobre o sexo dos anjos.

 

* "Fora as (MUITAS) alterações que eu fiz "Este artigo foi publicado no "DM Revista". E parece que muito bem recebido pela crítica especializada.

 

publicado às 15:25


1 comentário

De arage@sapo.pt a 06.12.2008

Oi amiga
também espero nesta altura esta no ceu ou no inferno mas par algumas coisas já não falta tanto tempo

jinho

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